Se é trabalhador independente e acumula com trabalho dependente, tenha cuidado com a próxima entrega da declaração trimestral. A Segurança Social (SS) está a cobrar mesmo que esteja isento. O Observador mostra-lhe dois casos que comprovam que algo não está bem com o novo sistema que arrancou no início do ano.
Os casos de Catarina e Nuno são ligeiramente diferentes, mas com muitas coisas em comum: acumulam o trabalho dependente (pelo qual as respetivas empresas descontavam para a SS) e independente, estavam isentos de pagar contribuição pelo rendimento que recebiam em recibos verdes e ambos entregaram (erradamente) a declaração trimestral. Porquê erradamente? Porque não tinham de o fazer. Estavam isentos antes e assim deveriam ficar: isentos.
Só que a informação quanto ao novo regime da declaração trimestral (introduzida em janeiro e alvo de uma extensa campanha de divulgação pela SS) não é clara sobre se quem antes estava isento tem ou não de passar a preencher. Na dúvida, estes dois contribuintes fizeram-no.
Vamos por partes. Nuno Duarte deixou de trabalhar numa empresa em agosto de 2018, mas no mês anterior já tinha contrato sem termo com outra. “Em momento algum deixei de ser trabalhador dependente e acumulei sempre com trabalho independente”, escreveu Nuno no Portal da Queixa. Ou seja, nunca falhou nas contribuições mensais para a Segurança Social. Apesar disso, no momento em que preencheu a declaração trimestral no site da Segurança Social reparou que tem uma dívida pelos meses de setembro e outubro de 2018.
“Há algum erro da segurança social pois todos os meses tenho feito os pagamentos, tal como o próprio site indica na pagina das minhas contribuições”, salientou. Este contribuinte não diz de quanto é a “suposta dívida” — como lhe chama — mas apelou à segurança social que verifique os factos que descreveu, no sentido de “regularizar a situação”.
O caso do Nuno envolveu uma mudança de empresa, algo que poderia ter acionado os sistemas automáticos da Segurança Social. Só que há também o caso de Catarina, que não mudou de empresa em 2018.
Também numa reclamação apresentada no Portal da Queixa, esta contribuinte diz que somou um total de 1.187 euros de rendimento enquanto trabalhadora independente no quarto e último trimestre de 2018. Este é o trimestre usado para calcular a contribuição agora introduzida.
No dia 17 de janeiro de 2019, Catarina recebeu uma mensagem genérica da Segurança Social, que a informava relativamente à entrega da declaração trimestral: “se ainda não pediu a senha de acesso a Segurança Social Direta, faça-o com brevidade. Até 31/01 tem de efetuar a declaração trimestral através deste canal”, indicava a mensagem.
À semelhança de Nuno, Catarina também estava isenta do pagamento enquanto trabalhadora independente. Posto isto, e com a informação que recebeu da mensagem, achou que seria mais correto preencher a declaração. A acrescentar à mensagem, Catarina também recebeu um email que a informava de que “se acumula atividade de trabalhador independente (TI) com atividade de trabalhador por conta de outrem e no total dos últimos 3 meses obteve rendimentos de TI acima de 7.470 €, tem de entregar até 31 de janeiro de 2019 a declaração trimestral na Segurança Social Direta”.
Tal como já foi referido, nesse trimestre recebeu 1,187 euros de rendimento, um valor muito inferior ao limite. Ainda assim, Catarina preencheu a declaração. Depois de o fazer, recebeu a conta: a Segurança Social pediu-lhe uma quantia de cerca de 177 euros (cerca de 59€ por cada um dos três meses).
Catarina refere na queixa que o Decreto-Lei que regula este novo sistema não é “esclarecedor relativamente à não obrigatoriedade de entrega da declaração”. Posto isto, pede apenas uma coisa: “ou anulam a minha declaração trimestral ou esclareçam e resolvam este erro o mais breve possível”.
Mudança das regras para os trabalhadores independentes
Com a alteração do regime contributivo dos trabalhadores independentes, em vigor desde 1 de janeiro de 2019, a isenção do pagamento de contribuições para a Segurança Social para um trabalhador independente e dependente depende do nível de rendimentos obtidos com a atividade independente. Para os trabalhadores independentes e dependentes, apenas se tem em conta os rendimentos de recibos verdes. Para estar isento de contribuições para a Segurança Social o rendimento relevante mensal médio, apurado de três em três meses, tem de ser inferior a quatro vezes o Indexante dos Apoios Sociais (IAS).
O problema está no preenchimento de uma declaração trimestral que nunca deveria ter feito. Um trabalhador que seja independente, mas também dependente, automaticamente não tem de o fazer. Ainda assim, depois de receberem um email sobre o assunto (que não faz essa ressalva), o erro é comum: preencher a declaração.
Mas como é que alguém que está nesta situação pode resolver o problema? O primeiro passo é, normalmente, contactar a Segurança Social Direta. O Portal da Queixa lista vários casos de contribuintes que se queixa do atendimento telefónico da Segurança Social.
O Observador contactou a Segurança Social Direta para tentar perceber qual seria a melhor forma de agir. A conversa inicialmente passa por tentar perceber se existe realmente um erro: perguntam o valor do rendimento enquanto trabalhador dependente mensalmente, e se o valor de rendimento de trabalhador independente é superior a 7.470 euros, o limite a partir do qual perde a isenção. Depois, aconselham a enviar um email para o centro distrital a explicar a situação, mas caso não fique regularizada, para efetuar o pagamento. Ao telemóvel, o operador da Segurança Social Direta disse ao Observador que o mais provável seria a devolução do pagamento, mas não deu prazos nem garantiu uma decisão favorável ao contribuinte.
Quando os telefonemas não são atendidos, há também a possibilidade de fazer uma marcação presencial. O Observador tentou perceber qual seria a data mais próxima para fazer uma marcação. A única data disponível em Lisboa era no mês de abril.
O portal de queixas tem neste momento mais de 6 mil queixasrelativamente à Segurança Social. A taxa de resposta está nos 12%. Em janeiro de 2019, das 179 queixas que foram feitas, apenas 5 estão assinaladas como resolvidas. O índice de satisfação varia entre os 0 e os 100, e o da Segurança Social é de 13,3. Estes são casos específicos, mas existem muitos mais que ainda esperam resposta.